Sumario

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BRASIL. A ÁRVORE DO TEATRO DO OPRIMIDO

Por Augusto Boal

 

Desde o ano de 1970, quando sistematizei as Técnicas do Teatro Jornal, o Método do Teatro do Oprimido não tem parado de crescer, no Brasil e nos cinco continentes, sempre acrescentando novas Técnicas que respondem às novas necessidades, e não abandonando nenhuma.
A enorme diversidade de Técnicas e de suas aplicações possíveis - na luta social e política, na psicoterapia, na pedagogia, na cidade como no campo, no trato com problemas pontuais em uma região da cidade ou nos grandes problemas econômicos do país inteiro - não se afastaram, nunca, um milímetro sequer, de sua proposta inicial, que é a apoio decidido do teatro às lutas dos oprimidos.
Essa diversidade não é feita de Técnicas isoladas, independentes, mas guardam estreita relação entre si, e têm a mesma origem no solo fértil da Ética e da Política, da História e da Filosofia, onde a nossa Árvore vai buscar a sua nutriente seiva.
Estendendo-se além das fronteiras habituais do teatro, nosso novo projeto, "A Estética do Oprimido", busca devolver, aos que o praticam, a sua capacidade de perceber o mundo através de todas as artes e não apenas do teatro, centralizado esse processo na "Palavra" (todos devem escrever poemas e narrativas); no "Som" (invenção de novos instrumentos e de novos sons); e na "Imagem" (pintura, escultura e fotografia). Cada folha desta Árvore dela faz parte indissolúvel até alcançar as raízes e a terra.
Os frutos que caem ao solo servem a se reproduzir pela "Multiplicação". A sinergia criada pelo T.O. aumenta o seu poder transformador na medida em que se expande e que entrelaça diferentes grupos de oprimidos: é preciso conhecer não apenas as suas próprias, mas também as opressões alheias. A "Solidariedade" entre semelhantes é parte medular do T.O.
No tronco da Árvore surgem, primeiro, os "Jogos", porque reúnem duas características essenciais da vida em sociedade: possui regras, como a sociedade possui leis, que são necessárias para que se realizem, mas necessitam de liberdade criativa para que o Jogo, ou a vida, não se transforme em servil obediência. Sem regras não há Jogo, sem liberdade não há vida.
Além dessa essencial característica metafórica, os Jogos ajudam à desmecanização do corpo e da mente alienados às tarefas repetitivas do dia a dia, especialmente às do trabalho e às condições econômicas, ambientais e sociais de quem os pratica.
O corpo, no trabalho como no lazer, além de produzi-los, responde aos estímulos que recebe, criando, em si mesmo, tanto uma máscara muscular como outra de comportamento social que atuam, ambas, diretamente sobre o pensamento e as emoções que se tornam, assim, estratificadas. Os Jogos facilitam e obrigam a essa desmecanização sendo, como são, diálogos sensoriais onde, dentro da disciplina necessária, exigem a criatividade que é a sua essência.
A palavra é a maior invenção do ser humano, porém traz consigo a obliteração dos sentidos, a atrofia de outras formas de percepção.
Arte é busca de verdades através dos nossos aparelhos sensoriais. No "Teatro Imagem", dispensamos o uso da palavra - a qual, no entanto, reverenciamos! - para que possamos desenvolver outras formas perceptivas. Usamos o corpo, fisionomias, objetos, distâncias e cores, que nos obrigam a ampliar nossa visão "sinalética" - onde significantes e significados são indissociáveis, como o sorriso da alegria no rosto, ou as lágrimas da tristeza e do pranto -, e não apenas a linguagem "simbólica" das palavras dissociadas das realidades concretas e sensíveis, e que a elas apenas se referem pelo som e pelo traço.
O "Teatro Jornal" - doze técnicas de transformação de textos jornalísticos em cenas teatrais - consiste na combinação de Imagens e Palavras revelando, naquelas, significados que, nestas, se ocultam. Mostra que um jornal, por exemplo, usa técnicas de ficção, tal como a literatura, porém suas: a diagramação, o tamanho das manchetes, a colocação de cada notícia dentro das páginas, etc.
"O Teatro Jornal" serve para desmistificar a pretensa imparcialidade dos meios de comunicação. Se jornais, revistas, rádios e TVs vivem economicamente dos seus anunciantes, não permitirão jamais que informações ou notícias verdadeiras revelem a origem e a veracidade daquilo que publicam, ou a quais interesses servem - a mídia será sempre usada para agradar aqueles que a sustentam: será sempre a voz do seu dono!
O mesmo acontece com as Técnicas Introspectivas do "Arco-Íris do Desejo" que, usando Palavras e, sobretudo, Imagens, permite a teatralização de opressões introjetadas. Nestas Técnicas - que se voltam para dentro de cada um de nós, mas sempre buscando ressonâncias no grupo -, mesmo nestas Técnicas, que são parte da Árvore do TO, o objetivo é mostrar que essas opressões internalizadas tiveram sua origem e guardam íntima relação com a vida social. Uma de suas técnicas principais, "O Policial na Cabeça", mostra que, se ele existe, de algum quartel veio, exterior à subjetividade do sujeito.
O "Teatro Fórum" - talvez a forma do TO mais democrática e, certamente, a mais conhecida e praticada em todo o mundo, usa ou pode usar todos os recursos de todas as formas teatrais conhecidas, a estas acrescentado uma característica essencial: os espectadores - aos quais chamamos de "Spect-atores") - são convidados a entrar em cena e, atuando teatralmente e não apenas usando a palavra, revelar seus pensamentos, desejos e estratégias que podem sugerir, ao grupo ao qual pertencem, um leque de alternativas possíveis por eles próprios inventadas: o teatro deve ser um ensaio para a ação na vida real, e não um fim em si mesmo.
O espetáculo é o início de uma transformação social necessária e não um momento de equilíbrio e repouso. "O fim é o começo"!
O "Teatro do Oprimido", em todas as suas formas, busca sempre a transformação da sociedade no sentido da libertação dos oprimidos. É ação em si mesmo, e é preparação para ações futuras. Como sabemos todos, não basta interpretar a realidade: é necessário transformá-la!
Essas transformações podem ser buscadas também em ações ensaiadas, realizadas teatralmente, como teatro que é, mas de forma não revelada, ao público ocasional de transeuntes, não conscientes da sua condição de espectadores. Provoca-se a interpenetração da ficção na realidade e a da realidade na ficção: todos os presentes podem intervir a qualquer momento na busca de soluções para os problemas tratados. O espetáculo "invisível" pode ser apresentado em qualquer lugar onde sua trama poderia realmente ocorrer ou teria já ocorrido (na rua ou na praça, no supermercado ou na feira, na fila do ônibus ou do cinema...) Atores e espectadores encontram-se no mesmo nível de diálogo e de poder, não existe antagonismo entre a sala e a cena, existe superposição.
Esse é o "Teatro Invisível".
As "Ações Diretas" consistem em teatralizar manifestações de protesto, marchas de camponeses, procissões laicas, desfiles, concentrações operárias ou de outros grupos organizados, comícios de rua, etc., usando-se todos os elementos teatrais convenientes, como máscaras, canções, danças, coreografia, etc.
Finalmente, mesmo sabendo que no Brasil, pelo menos - mas creio que em toda parte -, as leis muitas vezes não passam de simples sugestões, leis não "pegam", como se diz, é melhor tê-las do nosso lado do que contra nós. O "Teatro Legislativo" é um conjunto de procedimentos que misturam o "Teatro-Fórum" e os rituais convencionais de uma Câmara ou Assembléia, com o objetivo de se chegar à formulação de Projetos de Lei coerentes e viáveis. A partir daí, temos que seguir o caminho normal da sua apresentação às Casas da Lei e pressionar os legisladores para que os aprovem.
O CTO-Rio já conseguiu, com esse método, a aprovação de 15 leis municipais e duas estaduais.
O objetivo de toda árvore é dar frutos, sementes e flores: é o que desejamos para o "Teatro do Oprimido" que busca não apenas conhecer a realidade, mas a transformá-la ao nosso feitio.
Nós, os oprimidos.

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